20130107

A lenta agonia da diástole



Outrora lambia os teus passos pelos corredores que me passavam à frente dos olhos e ressentia o facto de nada me dizeres, embora sentisse uma ligação qualquer pelo ar e não eram as ondas hertzianas.
Acabei por me ir embora do lugar da convivência possível com ressentimentos em relação a ti por saber que havia algo, mesmo confirmado pelo nosso amigo em comum, e nunca ter tido uma janela de confirmação. Provavelmente, uma tipa de cabelo cor de laranja quer arranjar um gajo com cabelo rosa choc com mínimo discurso excêntrico possível.
Durante uns tempos ainda pensei que nos iríamos encontrar em algum lugar, mas pouco tempo depois soube-te comprometida com alguém e ficaste associada a uma imbecilidade da minha parte de ter imaginado algo que não existia.
Quando tempos mais tarde se manifestou uma opinião tua acerca de mim, óbvio é que o que estava enterrado ressurgisse. Nunca teria havido uma atenção prévia e no entanto sentias que tinhas algo a dizer sobre mim…sem me conheceres ou o que tinha acontecido.
Mesmo assim pensei que se tivesses sentido alguma coisa não teria sido forte ou profunda, o suficiente para te fazer tomar uma acção, a ti uma mulher que trata a vida por tu.
Pouco tempo mais tarde senti-te emocionalmente ligada a mim, porque ninguém quer chocar alguém com conversas de pilas extra grandes, se nada sentir pelo alvo.
Ressurgiu algo relativo ao suposto engano da minha parte que não havia sido. Mas não desapareceu a animosidade pois alguém que é capaz de afogar o que sente por mais fraco que seja o sentimento, é alguém calculista e com um auto controlo que impede qualquer tipo de abertura franca de peito. Por um lado é motivo de admiração por outro é motivo de cautela especialmente se aquilo que se procura é um acesso à tua intimidade.
Por fim, a sensibilidade à tua existência e a jocosidade à ideia de uma amizade, apenas compreensível pela escassa convivência entre nós, revelaram-me que não havia nada a fazer enquanto a compreender algo entre nós. Lição de humildade pois nem tudo se deixa reduzir a meia dúzias de proposições que magicamos nas nossas cabeças.
Erigiu-se uma cidade contra minha (pelo menos) cidade e estas foram as nossas trompetas de Jericó.
Acabámos aos toques de língua por ruelas de Lisboa, num momento em que provavelmente te encontras com menos ânimo na tua existência, numa antiga vontade minha e que nos apanha a ambos em determinado ponto do rio onde já não se tolera o som que alguns seixos fazem a água murmurejar.
A ausência desse gosto pelo silêncio que a água ruidosamente pressagia caracteriza exactamente a passagem pelo tempo que não nos deixa mais maduros mas mais velhos, perto da morte final, porque gastos prematuramente em cogitações sob a carga de experiências passadas.
Afinal foi apenas um duelo de línguas. Para mim não foi. Foi apenas o testemunho de algo trágico, que devia ter acontecido e não aconteceu.
Frontal como um choque de locomotivas a demasiada consciência exaurida das lutas de sujeitos numa relação, especialmente quando um deles busca a intimidade do outro.
Criou calo, e agora é a zona de conforto, não dispostos aos excessos do passado, e a cansar por caminhos já percorridos. Dissemos a nós mesmo que havia bastado.
E deitámos fora a criança juntamente com a água do banho. Eu não, tu. Uma prova disso é o meu texto que te passa agora pelos olhos. Podes dizer que é um dos artifícios clássicos de (previamente notado ) sedução, mas teria porventura mais sucesso cumprindo as habilidades que presenteias como dicas e regras. Para quem gosta de sinceridade, não há mais sincero que falar na solidão da leitura de um texto e não nos diálogos inconvencionais por uma rede social.
A imaturidade arrasta sentimentos fortes além de um mudo confortável de barbie e ken, e por isso deve ser respeitada e não vista como um degrau imperfeito na nossa caminhada pelo tempo.
É difícil verbalizar e trazer ordem a isto especialmente ao que te estou a dizer e que me faz passar como um azarado ao jogo no casino do Estoril, que ainda não percebeu que não há maneira de ganhar e vai acabar pendurado no candeeiro da saba com um lençol abraçado ao pescoço.
Claro como uma bofetada na tromba, a ideia de que quem menos se entrega ou mais se controla melhor controla o fluxo  e uma das formas de controlo passa pelo desapego no qual és mestre.
No qual sou cego.
Então torna-se claro ..eu não aprendi. Apenas repeti a mesma fórmula ano após ano.
Tu evoluíste. Refinaste-te após cada percussão do metrónomo, e estás numa escala de controlo muito acima da cave onde me vomito.
Ou então estás nem aí…e voltamos ao início…eu como espantalho que inclina o pescoço para trás sempre que sente um afago, esperançado que seja o teu, e não um corvo que lhe deseja a palha jugular.
E sabes, apesar do erro clássico, inclinaria de novo o pescoço para trás mesmo que me valesse o epíteto de J o ‘estúpido’ significaria que estaria sempre à espera do teu toque e a fornalha não deixava apagar o lume, que em ti com o tempo comigo deixaste extinguir.
Sísifo só enganou os deuses durante algum tempo. Eu engano-me há uma eternidade.