Como soluço chorado no peito da noite espreito a janela do
teu quarto onde desejava estar a fazer amor, a macerar o meu corpo em espasmos
que me esgotassem de dentro para fora, e poder em paz poder falar de amor sem o
esperma a pressionar-me as têmporas.
Limito-me a beber a chuva que recolho no meu rosto através
das arestas que culminam nos meus olhos apontados para teu quarto. Deixei-te
num pilarete um livro com meses de confissões para nós enrolado em plástico
para proteger da chuva que teima em querer desfazer qualquer papel testemunha
da minha obsessão por ti.
Horas acompanhado pelos cigarros que não fumo a partir a
cabeça a tentar perceber um mundo que me interpela e me espanta pela
complexidade que não se adivinha e me esmurra na cara sempre que parece que o estrangulo
com uma chave ao pescoço. Horas a confessar-me para ti em assuntos que te
passam ao lado como cometa profetizado no dia da morte de César e queimas tudo como um bando de folhas
murchas que varreste no jardim.
Que lição me deu a vida nesse dia, a do eterno abismo entre
o meu mundo interior e o que morre fora de mim. Não entro mais em casa que não me convida, e
guardo quando consigo os labirintos da minha cave, apesar de o som que vem do
mundo chilreante me usar como caixa de ressonância para ampliar o próprio ruído
a que chama música.
Passeio horas a lembrar as curvas do teu rosto os teus
cabelos louros e pretos, castanhos e como a minha mão caminha tacteando todas
as curvas do teu crânio e a ponta dos meus dedos sentindo a tua pele oleosa,
seca, quente ou com cadáveres de laca, massajando-te afagando-te, em carinhos
que achas infantis.
Como rotundo fracasso, forço a minha entrada em
rectangulares sucessos adiados, que derivam entre abraços masculinos com
validade genética.
Caminho sozinho de mão dada na tua, pela noite junto ao rio,
com vento estival sussurrando na nuca, e um arrepio que pressagia o Outono, e
sinto que tal como as estações do ano, o tempo passa em ciclos de morte e
renascimento, e que nunca mais vou despedaçar meus lábios contra um jovem rosto
de coração destravado, morre dentro de mim como ampulheta sem gás as ilusões
que faziam bombear o entusiasmo que dava vida à vida, parecendo que vou
estagnar num ocaso lento sedento pelo último raio de sol.
Tanto procurei por
entender que a magia esboroa-se como fatia de pão quinzenal deserta de
entusiasmo por caminhos não trilhados e tempo para os trilhar.
Onde encontrar outra viatura que acelere a fundo o pedal
para chocar comigo de frente num abraço de cuspo e suspiros já não podendo
adiar a distância que oprime, cessando a individuação, onde encontrar a refém
que me arranque da humanidade consciente que é sentir o seu desejo puro
cristalino directo e sem desculpas ou paragem nas boxes, alguém que sirva de
escolho para meu casco naufragar violentamente que sorva avidamente o que a
vida lhe dá sem a pretensão de controlar cada diástole e que seja como eu
humana, presa de si mesma e do pulsar que nos une a todos na carne e nos afasta
no espírito?
Viras-me o traseiro que se aninha sob o abraço que te dou, e
logo a natureza me chama para o transe a energia teima em não morrer moribunda
fingida sob a indagação se sou eu uma ficção, ou se o mundo que me rodeia está
pejado de autómatos.